sábado, 21 de abril de 2018

O Vendedor de Sonhos - Augusto Cury


— A vida é longuíssima para se errar, mas assombrosamente curta para se viver. A
consciência da brevidade da vida perturba a vaidade dos meus neurônios e me faz ver que sou
um caminhante que cintila nas curvas da existência e se dissipa aos primeiros raios do tempo.
Nesse breve intervalo entre cintilar e dissipar, ando à procura de quem sou. Procurei-me em
muitos lugares, mas me achei num lugar anônimo, no único lugar onde as vaias e os aplausos
são a mesma coisa, o único lugar onde ninguém pode entrar sem permitirmos, nem nós
mesmos.
”Ah! Se eu pudesse retornar no tempo! Conquistaria menos poder e teria mais poder de
conquistar. Beberia algumas doses de irresponsabilidade, me colocaria menos como aparelho
de resolver problemas e me permitiria relaxar, pensar no abstrato, refletir sobre os mistérios
que me cercam.
”Se eu pudesse retornar no tempo, procuraria meus amigos da juventude. Onde estão? Quem
está vivo? Eu os procuraria e reviveria as experiências singelas colhidas no jardim da
simplicidade, onde não havia as ervas daninhas do status nem a sedução do poder financeiro.
”Se eu pudesse retornar, daria mais telefonemas para a mulher da minha vida nos intervalos
das reuniões. Procuraria ser um profissional mais estúpido e um amante mais intenso. Seria
mais bem-humorado e menos pragmático, menos lógico e mais romântico. Escreveria poesias
tolas de amor. Diria mais vezes ’eu te amo!’. Reconheceria sem medo: ’Perdoe-me por trocá-la
pelas reuniões de trabalho! Não desista de mim’.
”Ah, se eu pudesse retornar nas asas do tempo! Beijaria mais meus filhos, brincaria muito
mais, curtiria sua infância como a terra seca absorve a água. Sairia na chuva com eles, andaria
descalço na terra, subiria em árvores. Teria menos medo que se ferissem e se gripassem, e
mais medo de que se contaminassem com o sistema social. Seria mais livre no presente e
menos escravo do futuro. Trabalharia menos para lhes dar o mundo e me esforçaria muito mais
para lhes dar o meu mundo.”
— Se eu pudesse retornar no tempo, daria todo o meu dinheiro para ter mais um dia com eles
e faria desse dia um momento eterno. Mas eles se foram; as únicas vozes que ouço são as que
ficaram ocultas nos escombros da minha memória: ”Papai, você é o melhor pai do mundo, mas
o mais ocupado também”. Após declamar essa poesia, lágrimas escorriam volumosamente
pela sua face, ratificando que os grandes homens também choram. E finalizou com estas
palavras:
— O passado é meu algoz, não me permite o retorno, mas o presente levanta generosamente
meu semblante descaído e me faz enxergar que não posso mudar o que fui, mas posso construir o que serei. Podem me chamar de louco, psicótico, maluco, não importa. O que importa é que,
como todo mortal, um dia terminarei o show da existência no pequeno palco de um túmulo,
diante de uma platéia em lágrimas
— Nesse dia, não quero que digam: ”Eis que nesse túmulo repousa um homem rico, famoso e
poderoso, cujos feitos estão nos anais da história”. E nem que digam: ”Eis que jaz nele um
homem ético e justo”. Pois isso é mera obrigação. Mas espero que digam:
”Eis que nesse túmulo repousa um simples caminhante que entendeu um pouco o que é ser um
ser humano, que aprendeu um pouco do que é ser apaixonado pela humanidade e que conseguiu um pouco vender seus sonhos para outros  passantes.





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